Projeto Conviver capacitará professores da educação básica para identificar e combater violência no ambiente escolar
Agressões intencionais e repetidas, violência psicológica, ameaças constantes são fatores que podem configurar a prática do bullying. As vítimas geralmente apresentam sinais como angústia, sentimento de humilhação e até isolamento do meio social. Um projeto da Universidade Federal do Paraná vai capacitar profissionais de 114 escolas de Curitiba e região metropolitana para o reconhecimento e o enfrentamento de situações dessa natureza. A aula inaugural acontece neste sábado (3).
O grupo de pesquisa Interagir, do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Paraná, estuda questões relacionadas ao bullying há quatro anos. Uma das preocupações dos pesquisadores é como identificar as vítimas e agressores no ambiente escolar.
O trabalho deu origem ao projeto Conviver. A iniciativa está entre quatro propostas nacionais selecionadas pelo Ministério da Educação para a formação de profissionais da educação básica voltada para a educação em direitos humanos e diversidade.
Os projetos escolhidos receberam aporte financeiro para promover a formação continuada pela modalidade aperfeiçoamento, com foco na prevenção e combate à violência, ao preconceito e à discriminação no ambiente escolar.
Por meio de módulos online, o projeto da UFPR vai atender mais de 370 professores e gestores de 114 escolas de Curitiba e quatro municípios da região metropolitana. As instituições participantes apresentam diferentes perfis: escolas rurais, indígena, instituições municipais, estadual e particular; e educação de jovens e adultos.
O objetivo do Conviver é capacitar educadores para que reconheçam e adotem estratégias eficazes para monitoramento e atendimento das múltiplas formas de violência, preconceito e discriminação no ambiente escolar. O projeto dá ênfase a casos de bullying.
“Às vezes ignoramos micro-agressões e a violência do cotidiano como se fossem menos importantes. Esperamos uma violência muito grave para intervir, mas os estudos mostram que há prejuízos ao longo da vida, inclusive relacionados à saúde mental dessas vítimas”, afirma o coordenador do projeto, professor Josafá Moreira da Cunha.
Com 23 anos de experiência na área de educação, como professora alfabetizadora e pedagoga nos anos iniciais do ensino fundamental, Adriana Alflen conta que já presenciou bullying em sala de aula. Ela integra a turma do projeto Conviver 2018.
De acordo com a professora, em um dos casos houve discriminação de gênero e a convivência do estudante ficou complicada no ambiente escolar e também familiar. “Era visível o sofrimento do estudante e o despreparo dos docentes que trabalhavam na escola”, relata Adriana que atualmente é diretora do Departamento de Ensino Fundamental no município de São José dos Pinhais.
A expectativa é que o projeto capacite os professores para lidar com tais situações. “Os docentes devem ter clareza de como encaminhar e mobilizar ações para assegurar a garantia de direitos”, diz Adriana. “Após a capacitação o docente terá uma bagagem de conhecimento que o fará refletir e escolher a melhor estratégia de ação pedagógica para garantir a educação em direitos humanos”.
A professora Gabriela Reyes, do Departamento de Educação da UFPR,explica que os professores encontram dificuldade em identificar casos de violência e maus tratos. “No curso, vamos mostrar os principais sinais para identificação de que há algo errado com a criança e, principalmente, como agir diante desses casos”, diz.
Para a professora Adriana, “uma vez que o profissional compreenda o seu papel nessa mediação e execução de estratégias que promovam a Educação Integral do aluno, o professor compreenderá seu papel social e político nas diretrizes da política educacional para educação com qualidade social”.
O coordenador do projeto explica que ao falar de promoção da convivência, o projeto vai além da proposta de acabar com o bullying. “O Conviver quer promover comunidades de pessoas conectadas com relações restauradas de confiança e respeito, em uma instituição em que todos ganham”, afirma.
Aula inaugural e metodologia
Os professores participarão de módulos online e três encontros presenciais. A aula inaugural e o primeiro encontro presencial acontecerá no dia 03 de março, com uma palestra da professora Aída Monteiro, considerada uma das maiores especialistas brasileiras em Educação em Direitos Humanos.
A programação começa às 8h, no Teatro da Reitoria. Além da palestra de abertura “Educar em Direitos Humanos”, haverá oficinas para os cursistas.
Por meio do portal, o projeto oferece acesso à biblioteca de recursos, webconferência e fórum para dúvidas. Vinte profissionais receberam formação para atender aos cursistas.
Durante o projeto, a equipe do Conviver realizará visitas mensais em todas as escolas participantes ao longo do projeto.
Relatório sobre bullying
O Conviver deu seus primeiros passos em 2016, como projeto-piloto. Cerca de 40 professores da educação básica de Curitiba participaram de oficinas ministradas pela equipe da UFPR.
Na época, o grupo de pesquisa realizou um levantamento com mais de 1.200 estudantes de escolas do ensino fundamental de Curitiba.
Os dados mostraram que mais de 57% dos entrevistados já sofreram agressões no ambiente escolar. A pesquisa também apontou que 36,3% sofreram agressões por meio da internet, a chamada cybervitimização.
“Coletamos dados sobre como as crianças estavam e devolvemos para as escolas pensarem seu plano de ação com relação à temática”, conta o professor Josafá.
O levantamento de dados sobre o clima escolar é considerado um dos aspectos principais do projeto. Nesta edição, as informações serão utilizadas como recurso para planejamento de ações pelas escolas e redes de ensino. O relatório descritivo do projeto 2018 deve ser divulgado no mês de abril.
“Nossa Secretaria de Educação considera o Conviver importante dentro de uma política indutora para a elaboração de políticas públicas municipais”, afirma a diretora do Departamento de Ensino Fundamental no município de São José dos Pinhais, Adriana Alflen.
Parcerias internacionais
Universidades estrangeiras também estão engajadas no projeto.
A University of Victoria cedeu direitos para adaptação do programa Wits, desenvolvido atualmente em várias regiões do Canadá como estratégia para resolução de conflitos.
A versão brasileira do Witz, batizada de DIGA, será lançada no mês de abril. O DIGA disponibilizará uma série de materiais desenvolvidos em parceria com a instituição canadense.
Durante a realização do projeto Conviver, será produzido um levantamento sobre clima escolar e convivência nas escolas. A ação terá o apoio do professor Jonathan Santo, da Universidade de Nebraska. Durante o mês de março, Santo virá ao Brasil para auxiliar a equipe no processamento e análise dos dados coletados.
Outra parceria vem da University of Indianapolis, com a participação da professora Kendra Thomas, que vai contribuir com o planejamento e análise dos dados sobre clima. A professora americana deve visitar o projeto em Curitiba no mês de maio.
Pacto Universitário
A iniciativa do projeto é realizada em conjunto com o Comitê Gestor do Pacto Universitário pela Promoção do Respeito à Diversidade, da Cultura da Paz e dos Direitos Humanos. “A formação democrática e cidadã tem na escola o seu principal espaço de afirmação, mas também de violações. O projeto Conviver traz conhecimento teórico e prático para formulação de estratégias contra variadas formas de violência amparadas nas diretrizes da educação em Direitos Humanos”, afirma o coordenador do Pacto na UFPR, professor Leandro Franklin Gorsdorf.
“Esta ação se insere no horizonte de uma universidade comprometida com os Direitos Humanos e a democracia, principalmente com aqueles pertencentes ao ambiente educacional”, completa Gorsdorf.
O Pacto Universitário pela Promoção do Respeito à Diversidade, da Cultura da Paz e dos Direitos Humanos é uma iniciativa conjunta do Ministério da Educação e do Ministério da Justiça e Cidadania. O objetivo é promover a educação em direitos humanos no ensino superior.
A UFPR aderiu ao Pacto em dezembro de 2016 e é pioneira em ações que promovem os direitos humanos, tendo sido uma das primeiras universidades do País a adotar políticas de cotas e apresentando, com frequência, trabalhos e projetos que refletem e promovem a garantia desses direitos.